Domingo literário: Eu juro que estou ocupada

Hoje estou esquentando os motores do nosso Domingo Literário com um texto de minha autoria. Lembrando que esse é um espaço aberto para todos os leitores do Psicose enviarem as suas produções, só precisa seguir algumas regrinhas, que você pode conferir clicando aqui. 


"Eu juro que estou ocupada" é um texto que fala um pouco desse sentimento de julgamento que temos quando sentamos para escrever alguma coisa. Espero que gostem. 


Eu juro que estou ocupada


Eu ligo o computador. Quer dizer, deixo ele ligando. Você sabe como são essas tecnologias… 

Vou até a cozinha e abro a geladeira. Eu não sei o que quero. Nada parece muito apetitoso ou parece demasiadamente trabalhoso. 

Fecho. 

Sinto uma pequena pontada na bexiga e acho melhor ir ao banheiro. Sento. Olho para o teto. Pego o celular na pia e dou uma olhada nas redes sociais. Quando termino me limpo, aperto a descarga e lavo as mãos, tudo meio automático. 

Quando espio pela porta do quarto, posso ver que a área de trabalho já está aberta de forma brilhante e convidativa. 

Antes de sentar, decido pegar o meu caderninho da vida. Eu simplesmente anoto tudo nele. Que dizer, nem tudo. E nem são apenas coisas importantes, para falar a verdade, são apenas aleatoriedades que gosto de manter por perto. 

Sento e encaro a tela do computador. Alongo a minha coluna para ver se ela acorda, mesmo sabendo que seria melhor mantê-la dormindo, porque com certeza em algumas horas ela começará a berrar.

Faço o cursor do mouse voar pela tela até o programa de escrita. 

Eis que surge um papel digital em branco com uma barra piscando. 

Apoio os meus cotovelos na mesa e nas mãos a minha cabeça. Meus olhos ficam vidrados naquele pisca-pisca constante. Por alguns segundos, eu posso jurar que ele começa a ir mais rápido, como se pedisse ajuda com urgência para quem o observa. 

Ainda paralisada, encarando a imensidão da “branquitude” a minha frente, eu sinto que alguém me observa. 

Nessas horas julgo ter uma visão periférica muito boa. Eu sei que ela está ali com as mãos apoiadas na cintura me encarando com mais veemência do que eu encaro aquela barra piscante, mesmo ela sendo apenas um borrão no meu canto esquerdo do olho. 

“Tá fazendo o que aí?” 

“Estou ocupada...” 

Deixo minha resposta morrer. E como um eco ouço a voz dela em uníssono com a voz na minha cabeça: “Ocupada com o que?” 

Olhando assim, de fato, não estou ocupada. Talvez não do jeito usual. 

Para despistar mais perguntas, começo a escrever qualquer coisa nesse papel digital. Assim, eu silencio a voz dela, a da minha cabeça e esse pisca-pisca irritante que apesar de não ter voz alguma parece berrar em sua “linguagem de sinal”: escreva!

4 comentários:

  1. uaauuu... é assim mesmo... amei o texto!

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  2. Hahaha quem nunca!!!
    Adorei o texto Nina. =)

    www.vidacomplicada.com

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  3. Hahaha quem nunca!!!
    Adorei o texto Nina. =)

    www.vidacomplicada.com

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  4. adorei o texto. Me faz pensar em bastante coisa. Por que a gente passa tanto tempo com a cabeça pra baixo? O que acontece de tão interessante nas telas do pc e celular que deixa tão mais interessante que a vida da gente? A vida exterior, eu quero dizer. Do jeito que você escreveu me pareceu que tinha que ter essa obrigação de 'fazer', mas, por que nao simplesmente pensar em primeiro lugar? Por que nao deitar num gramado de um parque qualquer e olhar as nuvens e apreciar o que é belo quando se olha pra frente e/ou para cima? Sei que é até um pouco idiota eu escrever isso quando estou, agora mesmo, sentado olhando pra tela do meu pc e dizendo isso. Mas seu texto me fez pensar sobre...

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